Introdução
Segundo o Dicionário de Português, sintaxe tem o seguinte
significado:
sin·ta·xe |ss|
(grego súntaksis, -eós, ordenação, disposição, arranjo)
(grego súntaksis, -eós, ordenação, disposição, arranjo)
substantivo
feminino
1. [Linguística] Parte
da linguística que se dedica ao estudo das regras e dos princípios que regem a
organização dos constituintes das frases.
2. [Informática] Conjunto
de regras que regem a escrita de uma linguagem de programação.
"sintaxe", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, http://www.priberam.pt/dlpo/sintaxe [consultado em 10-12-2013].
O estudo e a reflexão da aquisição e desenvolvimento
da sintaxe por parte das crianças é de extrema importância para que se possam
compreender processos e estratificar fases de desenvolvimento.
Sintaxe e linguagem
Michael Studdert-Kennedy comenta a afirmação de Derek Bickerton em que
este último afirma que devemos reconhecer que a linguagem não é, primariamente,
um meio de comunicação mas sim, um sistema de representação, um meio de
manipular a informação que recebemos ao longo da vida. Para estes autores,
antes de falar temos de ter algo para dizer e todos os seres vivos têm uma
representação do mundo que os rodeia adequada à sua função. Bickerton afirma
que a parte mais importante da linguagem é a sintaxe porque nos distingue dos
animais.
A linguagem é articulação lógica de sons, palavras,
regras gramaticais e significados e é um dos pontos mais complicados dos seres
humanos dominarem no seu início de vida. Assim sendo demora cerca de 6 anos a
adquirir, sendo a capacidade metalinguística o fim do processo de aquisição da
linguagem. A partir deste ponto a criança apenas aperfeiçoa as suas estruturas
linguísticas.
Etapas na aquisição da Sintaxe
Segundo Paule Aimard, as crianças por volta dos 6 meses, mesmo antes de
saberem falar, compreendem proibições e repreensões e por volta de um ano de
idade já conseguem distinguir mais coisas. Nesta fase a criança compreende o
significado daquelas palavras mais repetidas no seu quotidiano como comer,
dormir, passear. Estas palavras sao as que a criança mais ouve e representam
aquilo que mais lhe interessa. Nesta fase são capazes também de compreender a
entoação de voz.
Uma vez que a criança constrói a sua linguagem a partir daquilo que ouve
e como na construção oral não é evidente a divisão entre palavras e frases, as
crianças, nesta fase inicial normalmente utilizam apenas enunciados de uma só
palavra, denominadas de palavra-frase. Segundo A.R. Luria, estas frases de uma
só palavra estão ligadas, no pensamento da crinça, a uma ação real. Desta forma
a palavra boneca pode significar “quero a boneca”. Uma vez que a
criança é apenas capaz desta frase chave, ela auxilia-se dos gestos e da
entoação para se fazer entender.
A passagem desta palavra-frase para a construção frásica é um processo de
pensamento complexo. A frase, segundo Luria, é um sistema organizado
serialmente. Por exemplo, a palavra ouvir exige outras palavras associadas para
responder às perguntas “a quem?” e “o que?”. Estas uniões sintáticas aparecem
na criança enquanto uma palavra que se encontra ligada às intenções práticas,
enquanto os seus gestos e ações ganham independência.
Com a criação de orações aparece um principio de organização da linguagem,
o princípio sintagmático, que consiste em que, na base da na base da organização dos enunciados verbais, não se
encontra uma hierarquia de contraposições, mas a passagem fluida de uma palavra
para a outra. Esta evolução nas orações não acontece de um momento para o
outro e é o resultado de um processo de desenvolvimento. Nas primeiras etapas,
a criança possui apenas palavras isoladas que enumerará por exemplo numa
descrição, mais tarde será capaz de utilizar palavras que não se subordinam ao
princípio paradigmático de estruturação, mas entram num sistema de séries
verbais ou de encadeamentos sintagmáticos sucessivos.
As palavras que entram na oração criam a alocução e
tais grupos são constituídos por elementos sintáticos isolados. Nesta base
formam-se enunciações que podem expressar pensamentos. Em todos estes casos, a
ideia, expressa pelo sistema de palavras, submete-se não ao princípio de
contraposição e de organização hierárquica, mas ao princípio da organização
sucessiva sintagmática.
As estruturas sintáticas desempenham uma função
importante na memória, pois as palavras recordam-se melhor numa estrutura do
que em forma de lista. A partir dos 18 meses aparecem os enunciados de duas ou
mais palavras e estas são ligações faladas mais longas. É nesta fase que
as crianças começam a aproximar duas unidades que se apresentam sob a forma de
unidades de duas sílabas: CVCV+CVCV e até mesmo de combinações menos frequentes
VCV+ CVCV. Estas unidades dissilábicas são geralmente simplificações das
palavras mais utilizadas como popó e papá. A tendência infantil de
redobrar as sílabas explica a frequência das produções tipo dodo, dada,
gugu, etc. Esta é a técnica sintática mais utilizada pelas crianças (sucessão),
no entantanto este tipo de enunciado não permite identificar e traduzir com
certeza o seu significado pois pode significar por exemplo: mama pota – mãe
fecha a porta, mãe bateram à porta. Para as crianças estes enunciados são
iguais pois partem de uma simples justaposição.
Uma característica da sintaxe precoce é o número de
simplificações que caracterizam as produções da criança em relação à linguagem
que ela ouve. Estas simplificações não afectam unicamente a sintaxe, mas todos
os níveis estruturais das produções. As modificações formais são de tal modo
gerais e constantes que os primeiros enunciados não têm quase nada a ver com o
que diria um adulto nas mesmas circunstâncias.
Por volta dos dois anos, produz-se na criança uma
evolução repentina, uma dinâmica verbal ou linguística, que terá talvez analogias
com o que determinados autores chamam competência. Ao mesmo tempo que a
criança adquire novas palavras, é posta à sua disposição uma quantidade de
modelos de funcionamento que lhe permitem rapidamente construir simultaneamente
todos os sistemas e subsistemas graças aos quais a língua funciona.
Paula Menyuk na sua obra Language Development.
Knowledge and Use, trata a problemática da sintaxe em conjunto com a semântica
pois uma é o complemento da outra , não se podendo, no plano do discurso,
tratar uma sem a outra. Menyuk considera que combinações de palavras têm
início e fim normalmente no segundo ano de vida e por volta dos sinco anos, a
criança terá completado a aquisição das estruturas semantáticas. A autora
considera que as crianças começam por pronunciar duas a três palavras
relacionadas entre si por volta dos dois/três anos e começa a tomar consciência
das regras gramaticais por volta dos três/quatro anos. A partir da segunda
infância, a criança constrói enunciados de duas a três palavras e compreende as
relações básicas de sujeito/verbo/complemento.
PERÍODO
|
CONHECIMENTO
|
Infância
|
relações semânticas básicas
Algumas regras de contexto
linguístico
regras de ordem de palavras
|
Segunda infância
|
Relações sintácticas de SVC
Expansão de tipos de frase
Coordenação e subordinação
em certos contextos
Conhecimento consciente da
boa aprendizagem das regras
|
Terceira Infância e
adolescência
|
Reorganização das regras de
semantaxe
Conhecimento consciente de
regras complexas
Excepções à regra e
apreensão superficial
Coordenação e subordinação
em todos os contextos
|
A
Imitação
A linguagem do adulto fornece à criança modelos a
imitar e a actualização de combinações através das quais a criança reconstitui
as regras pelos seus próprios meios.
O adulto adopta pouco a pouco um registo de língua
diferente quando fala com o bebé. O adulto passa a utilizar frases curtas,
simplificações sintácticas e vocabulário simples que estejam relacionados com
as situações concretas e familiares da criança como alimentação, jogos,
animais, partes do corpo, roupa, etc. No entanto, se a linguagem do adulto
permanecesse nas formas pueris que ele emprega no conversar com o bebé
de seis meses, a criança não progrediria mais, a sua linguagem permaneceria num
certo nível, sendo-lhe impossível alcançar o fim do processo de
transformação.
Nas condições de aquisição normal, a criança isola os
modelos que têm por vezes a dimensão de uma palavra. A dinâmica da aquisição
resulta do compromisso entre a imitação de formas escutadas globalmente e a
mobilização dos elementos variáveis. A criança percebe no discurso certos
elementos fixos, regulares e outros variáveis. Ela dá-se conta da permanência
de certas variáveis e estabelece uma relação entre marca superficial e as suas
condições de ocorrência.
Entre os dois e os três anos a criança aplica regras
de funcionamento, copia e utiliza modelos mas não o faz fielmente. A aquisição
depende de estratégias que ela emprega. Cada criança reutiliza os modelos numa
linguagem que lhe é própria.
Fontes:
Machado, J. Barbosa
(1994) O
desenvolvimento da sintaxe nas crianças
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